Aproveitar os descontos da Black Friday sem culpas? Movimentos Green Friday e Giving Tuesday podem ajudar
Iniciativas pretendem sensibilizar os consumidores para uma maior consciência ambiental na hora de aproveitar os descontos da “Black Friday”
Todos os anos, mais de 50 milhões de equipamentos eletrónicos vão parar ao lixo, mas menos de um quarto é reciclado
Comprar um novo telemóvel quando o atual deixa de funcionar ou comprar o gadget mais recente daquela marca tecnológica. A cultura de consumo de equipamentos tecnológicos é um dos principais problemas que enfrentamos, no que diz respeito à sustentabilidade do planeta.
São estes comportamentos que fazem do lixo eletrónico – ou e-waste – o tipo de resíduos sólidos que mais cresce no mundo, a um ritmo três vezes superior ao da população mundial.
Só em Portugal, cada habitante gera cerca de 16,6Kg de lixo eletrónico por ano (dados de 2019).
Enquanto a produção e consumo destes produtos aumenta, apenas menos de um quarto é reciclado, apesar do seu grande potencial. Se continuarmos a produzir cada vez mais lixo eletrónico, sem o reciclar, em 2030 o mundo terá o peso resíduos eletrónicos equivalente ao de 7390 Torres Eiffel. A ONU estima que o mundo chegue às 120 milhões de toneladas de lixo eletrónico em 2050.
O problema foi já detetado pela União Europeia como prioritário no seu plano de ação para a economia circular, com medidas que incentivam a reparação e reutilização dos materiais, como a introdução de um carregador comum e a criação de um sistema de recompensas para incentivar a reciclagem de equipamentos elétricos e eletrónicos.
A porta USB-C vai tornar-se o carregador comum para a maioria dos dispositivos eletrónicos na UE, até ao final de 2024. Os computadores portáteis terão de estar equipados com uma porta USB de tipo C até 28 de abril de 2026.
Mais recentemente, a UE aprovou um pacote de medidas que pretende aumentar a oferta de serviços de reparação, de forma competitiva, e combater, por outro lado, práticas que limitem a eficácia do produto. Desta forma, pretende-se atrasar o descarte dos equipamentos.
A proposta assegurará que mais produtos sejam reparados dentro do prazo da garantia legal e que os consumidores disponham de opções mais fáceis e mais baratas para reparar produtos quando a garantia legal tiver expirado ou quando o bem deixar de ser funcional devido ao desgaste.
Neste momento, na União Europeia, apenas 40% dos resíduos eletrónicos seguem para reciclagem.
Além disso, a UE adotou uma legislação destinada a impedir a utilização de alguns produtos químicos na composição dos produtos eletrónicos, que apresentam um grande risco de contaminação.
Os resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos são produzidos a partir de artigos como:
O descarte destes equipamentos representa um risco, pois os mesmos contém materiais nocivos, como platina, cobre ou paládio, que apresentam riscos para o meio ambiente e saúde humana, mesmo quando reciclados. O chumbo, por exemplo, é uma das substâncias comumente liberadas no meio ambiente se o lixo eletrónico for reciclado, armazenado ou descartado por meio de atividades de qualidade inferior, como a queima a céu aberto.
“Muitos minerais raros que são necessários nas tecnologias modernas são oriundos de países que não respeitam os direitos humanos”.
Parlamento Europeu
Além disso, substâncias como o chumbo aumentam os riscos para as pessoas envolvidas na reciclagem de equipamentos elétricos e eletrónicos – o que acontece sobretudo em países mais pobres, do sudeste asiático e África subsaariana, que carecem de infraestruturas adequadas e onde os direitos humanos não são respeitados. Entre os métodos ilícitos de “reciclagem informal” está o uso de produtos tóxicos ao ar livre e os banhos de ácido.
“O lixo eletrónico é também considerado perigoso porque contém materiais tóxicos ou pode produzir produtos químicos tóxicos quando tratado de forma inadequada. Muitos destes materiais tóxicos são conhecidos ou suspeitos de causar danos à saúde humana, e vários estão incluídos na lista de 10 produtos químicos preocupantes para a saúde pública, incluindo dioxinas, chumbo e mercúrio. A reciclagem inferior do lixo eletrônico é uma ameaça à saúde e à segurança públicas”
World Health Organization
O lixo eletrónico pode dar origem a uma variedade de outros produtos.
O aço de uma torradeira é suficiente para produzir 25 latas para uso alimentar. 88 telemóveis podem dar origem a um anel de noivado. O alumínio de um ferro de engomar pode ser usado para produzir latas de bebida.
Ondereciclar.pt
Mas, além da reciclagem, o combate ao lixo eletrónico faz-se pela mudança das práticas de produção e comportamentos de consumo. Sempre numa lógica de economia circular, com base no aproveitamento de materiais de produtos reciclados e numa menor dependência da extração de recursos mineral.
Afinal, a recuperação de resíduos tecnológicos para a fabricação de novos dispositivos acaba por ficar mais barata que a extração de minerais, além de poder vir a criar milhares de postos de trabalho. Além disso, extrair minerais envolve o recurso a uma grande quantidade de água ou energia.
Na Europa, tem surgido um movimento focado na reparação de equipamentos e aposta em produtos produzidos de forma mais sustentável e duradoura. O objetivo é reduzir o consumo de novos produtos.
Foi em Amsterdão que surgiu o conceito de Repair Café – espaços de reparação de aparelhos electrónicos para evitar o descarte de bens reparáveis. A ideia inspirou o surgimento de outras iniciativas, como o caso do projeto ReBOOT, no Porto.
Num esforço conjunto entre universidades, o Município do Porto e a Lipor, o projeto ReBOOT está a recolher e a recuperar equipamentos informáticos que já não se encontram em uso por empresas, organizações e pessoas.
Além disso, permite que as pessoas se juntem para aprender a recuperar os seus próprios equipamentos ou outros disponibilizados pela câmara, que são posteriormente entregues a entidades com projetos sociais que tenham necessidades específicas deste tipo de equipamentos.
Outro exemplo de iniciativas que mostram que é possível uma mudança na forma de produção e consumo dos produtos eletrónicos é a Fairphone. A marca de smartphones e acessórios criada em Amesterdão tem como mote “minimizar o impacto ético e ambiental dos seus dispositivos”, através do uso de materiais reciclados e de comércio justo.
Além disso, tem a preocupação de apostar na durabilidade dos seus produtos. Exemplo disso é o seu mais recente smartphone (Fairphone 5), que foi desenhado para facilitar a troca de peças e pode ser desmontado com facilidade.
Em declarações à Euronews, Miquel Ballester, Diretor de Gestão de Produtos da Fairphone, conclui que:
“Qualquer coisa que tenha uma placa de circuito impresso custa muita energia a fazer. Por isso, depois de o fazer, é preciso garantir que é utilizado durante o máximo de tempo possível. E isso é difícil, com parceiros em todo o mundo que ainda pensam de forma demasiado linear”.
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