“Cidades-esponja” são cada vez mais populares no combate às cheias 

Conceito criado pelo arquiteto chinês Kongjian Yu está a ser adotado em várias cidades ao longo do globo

cidade-esponja

As cheias representam 44% de todos os desastres relacionados com o clima que aconteceram na Terra desde 1970 (dados da World Meteorological Organization) e tendem a tornar-se mais intensas e destrutivas, se não adaptarmos as nossas cidades. 

Em 2024 tivemos já várias provas do agravamento do problema das cheias, a nível mundial. No Brasil, a quantidade anormal de chuva que caiu no Rio Grande do Sul, entre final de abril e maio, submergiu cidades inteiras, afetando mais de 1 milhão de pessoas e causando a morte de 172. 

Meses mais tarde, em setembro, a Europa Central era assolada pelas piores inundações em pelo menos duas décadas e que causaram 24 mortos, entre cidades destruídas, pontes caídas e edifícios danificados. Foi o resultado dos mais intensos quatro dias de precipitação alguma vez registados na Europa Central, de acordo com um relatório recente da World Weather Attribution

Esse mesmo documento conclui que as alterações climáticas duplicam a probabilidade de cheias como as que devastaram a Europa Central. E dada a insuficiente ação para travar os efeitos das alterações climáticas, as projeções para o futuro não são animadoras: é provável que as chuvas extremas se intensifiquem e, como provado, as nossas cidades não estão preparadas para tanta água. 

A criação do conceito “cidade-esponja”

Da China, onde grande parte das cidades de média e grande dimensão é vulnerável a cheias, emergiu uma solução que está a ser adotada em várias cidades por todo o mundo para prevenir os desastres provocados pelas enchentes. São as chamadas “cidades-esponjas”, um conceito pensado pelo arquiteto paisagista chinês Kongjian Yu. 

Ele próprio quase se afogou quando era criança numas inundações fluviais às quais sobreviveu agarrando-se a ramos da vegetação que ladeavam o rio. Hoje, é dono da Turenscape, uma das maiores empresas de arquitetura paisagística do mundo e que tem trabalhado na construção de “cidades-esponja” na China durante a última década. 

Na sua teoria, o “arquiteto das cidades-esponja” defende que podemos tirar proveito das chuvas intensas ao quebrar o cimento que pavimenta as nossas cidades e abrir caminho para que a água da chuva seja absorvida pelo solo e escoada para reservatórios. 

Este sistema constrói-se a partir de elementos como:

  • pavimentos permeáveis;
  • jardins nas fachadas e tetos dos edifícios;
  • parques, jardins e hortas urbanas;
  • jardins de chuva (espaços verdes projetados para reter e absorver a água da chuva que desliza por telhados, pátios, calçadas e ruas);
  • interligação entre os vários espaços verdes;
  • poços de infiltração e retenção;
  • reservatórios e lagos onde seja possível armazenar e purificar a água.

Aliado também no combate à seca

Na prática, uma “cidade-esponja” é uma infraestrutura verde que permite uma maior permeabilidade do solo e uma absorção da água pluvial. O aumento da vegetação é o fator-chave nesta equação, uma vez que a natureza absorve a água, previne o deslizamento de terras e, ao mesmo tempo, contribui para a purificação, de forma natural, da água

Por consequência, os esgotos tóxicos das cidades acabariam por extinguir-se. Além disso, devido ao seu modelo de armazenamento e purificação de água, as “cidades-esponja” permitem combater não só as cheias mas também a seca que, devido às alterações climáticas, afeta de forma cada vez mais severa uma grande parte da humanidade

No final de contas, estas são cidades mais ecológicas, que promovem a recuperação da biodiversidade e uma melhor qualidade do ar e de vida em zonas urbanas.

O que foi feito até agora

Foi em 2013 que o governo chinês decidiu adotar o conceito de “cidades-esponja” para fazer frente às cheias devastadoras que a sua população enfrenta ano após ano. Com a ajuda de Kongjian Yu, iniciou um programa experimental que envolvia 15 cidades com problemas de cheias.

Em quase uma década, até 2022, 64 cidades chinesas tinham já criado legislação que impulsionasse o seu redesenho urbano, sob a visão do arquiteto e professor, como explica a Reuters. A mesma fonte aponta para estudos que mostram que muitas das iniciativas piloto lançadas até agora na China, a nível local, passam por projetos de baixo impacto, como telhados verdes e jardins de chuva, e tiveram um “efeito positivo”. 

Por todo o mundo, outras cidades têm seguido o exemplo e adotado a filosofia das “cidade-esponja”, como são exemplo Copenhaga, na Dinamarca, ou Berlim, na Alemanha. Na Califórnia (Estados Unidos), Rússia e Indonésia também se têm testado soluções com base no conceito de “cidade-esponja” para combater o problema das cheias. 

No nosso país, ainda não há vislumbre de que este conceito possa influenciar o planeamento urbano. Pelo contrário, para combater as inundações em Lisboa, foi projetado um Plano Geral de Drenagem que prevê a construção de dois grandes túneis   até 2025, para escoar a água. 

No entanto, todos podemos aplicar um pouco da filosofia de Kongjian Yu e ajudar a converter as nossas cidades em “esponjas” contra cheias e secas, através de gestos como trabalhar na própria horta biológica ou mini floresta, ou simplesmente transformar a nossas casa e local de trabalho em espaços mais verdes.

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